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sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

O SISTEMA INCENTIVA O POLICIAL NA DISCRIMINAÇÃO DE POBRES E NEGROS!


Durante uma palestra que ministrei sobre Direitos Humanos, a soldada Carla Carvalho me perguntou: “Por que um oficial (posto de tenente a coronel) que fica à porta da sede da unidade policial sempre voltava às costas às praças (graduação de soldado(a) a subtenente) quando elas se aproximavam?” Depois fez uma colocação: se ao mencionado oficial era sempre destinado um “Bom dia” fosse pela cordialidade ou pela simples obrigação, uma vez que deixando um subordinado de cumprimentar seu superior hierárquico comete uma transgressão disciplinar, conforme prescreve o Art. 51, XIX da Lei nº 7990 de 27 de dezembro de 2001 - Estatuto dos Policiais Militares”. 
 
Depois fez outras perguntas: Será que o superior hierárquico considerava-se tão humanamente superior que não podia sequer responder a um cumprimento matinal de um subalterno e esqueceu que sua superioridade em relação às praças é relativa apenas à sua colocação no organograma da instituição, condicionada ao desempenho de suas funções profissionais? Depois ela faz outra colocação: “o comportamento daquele oficial apenas serve para demonstrar que no âmbito interno da corporação (leia-se polícia militar) as relações por vezes se realizam sem a atenção necessária as regras sociais e disciplinares, afastando-se da moral e dos deveres éticos”

Por fim, a última pergunta: “Quem inocentemente acreditaria que se invertendo os pólos, o subalterno ao avistar o superior hierárquico voltasse-lhe as costas com a intenção de negar-lhe a obrigatória prestação de continência, o oficial seria omisso em exigir seu direito, e deixaria, como um subordinado na situação vexatória, imperar o insulto à dignidade da pessoa e ao regulamento castrense, a fim de evitar maiores constrangimentos?”. Depois ela concluiu: “Com base no princípio da dignidade humana, ser polido, educado e praticar atos de cordialidade é reconhecer o outro enquanto ser humano, independente da hierarquia; é vê-lo no mesmo nível de igualdade quanto a você nos direitos, para que realmente seja estabelecido o respeito e a harmonia nas relações sociais”

Agora eu que pergunto: será que ela realmente não sabia as respostas, levando em consideração as colocações feitas após as perguntas? Ou sem perceber ela desabafou em forma de perguntas? Ou ela, sem querer, estava chamando minha atenção para o fato de vivermos em um País do “cada macaco no seu galho” ou usando uma expressão mais atual “cada um no seu quadrado”? Partindo do exposto pela soldada, passei a me questionar, qual seria a eficácia da minha palestra de Direitos Humanos para os policiais militares que é uma profissão bastante singular? A polícia militar é a única profissão que tem a obrigação de evitar ou minimizar os efeitos do sinistro, mas não tem nenhum poder para mudar ou acabar com as causas que dão origem aos fatos! Exemplo: o policial tem o dever de prender o traficante, mas não tem nenhum poder para criar escolas para educar as crianças ou praças de esportes para ocupar os jovens. Além desta peculiaridade, existem outras como a “hierárquia e disciplina”!

Muitas vezes, de forma “equivocada”, acho que nada mudou, em relação à criação da polícia, 1808, e os dias de hoje, onde vivemos no Estado Democrático de Direito. No livro “A Elite da Tropa”, um dos autores relata que, quando tenente da PMERJ, recebeu, do seu comandante, a missão de abrir uma rua que estava bloqueada. Entretanto aquela missão seria muito difícil, pois quem estava bloqueando a rua eram os alunos da PUC-RJ, e o Comandante fez questão de alertar o tenente que lá só estudam alunos com sobrenome de rua e que abrisse a rua sem confusão, pois quem ficaria prejudicado, caso houvesse constrangimentos eram os próprios policiais. Sobre este caso, o autor fez questão de ressaltar que quando quem faz a passeata são os pobres desdentados e negros que descem do morro, a ordem emanada é: “bote pra “foder”, abaixa o cacetete e, se o tempo “fechar”, atira antes e pergunta depois, mas quando são os filhos de papai da Zona Sul, lourinhos, com sobrenome de rua, o tratamento tem que ser cinco estrelas, policiamento VIP”(sic). Será que a conduta dos policiais militares durante o desempenho das suas atividades está de acordo com as legislações que aduzem os Direitos da Igualdade em um Estado Democrático de Direito? Ou será que temos uma polícia imperialista que tratam os cidadãos de acordo com suas origens étnicas e sociais? E como são tratados os policiais militares e seus familiares nos ambientes de trabalho, nos espaços de lazer, nos hospitais militares e nos eventos sociais nos quartéis? 
 
Quando eu tinha onze anos, fazia natação pela manhã no clube dos oficiais da PMBA e estudava no Colégio da Polícia Militar pela tarde, na mesma Vila Militar. Morava distante do local onde praticava natação e estudava. Sendo assim, ia para a natação e levava a minha marmita para, após a natação, almoçar e já ficar para a aula. A natação acabava por volta das dez horas e minha aula começava às treze horas. Tinha três horas de intervalo entre o término da natação e o início das aulas, e em trinta minutos eu tomava banho, vestia minha farda e almoçava, ou seja, ficava com duas horas e meia de tempo livre. Meus outros colegas que moravam longe permaneciam no clube (na piscina ou jogando bola), entretanto eu não podia ficar, pois meu pai era sargento da polícia militar e pela sua condição profissional era PROIBIDO de ser sócio! Já muito dos meus colegas que eram sócios, seus pais não eram policiais! Eu até hoje me questiono: qual o objetivo de um regulamento que aceita pessoas civis como sócios de um clube de oficiais da polícia militar e PROIBE a sociedade daqueles que estão sempre ao lado dos oficiais nas adversidades da profissão, algumas vezes perdendo as suas vidas, mas jamais deixando os oficiais sozinhos nas situações de risco?

Os quarteis brasileiros, com os atuais regulamentos em vigor, são a extensão da “casa grande e senzala” de dois séculos atrás, só com uma diferença: naquela época o Brasil era um país monarca, com nobreza, clero, súditos e escravos! O quê justifica no Estado Democrático de Direito – leia-se todos são iguais – o refeitório dos oficiais ter filé mignon ao molho de madeira, enquanto os soldados comem salsichas? Por que num evento social entre os familiares dos oficiais, o major NÃO pode levar a soldada que é sua esposa, mãe de seus filhos e pertencente ao quadro da polícia militar, enquanto outros oficiais PODEM levar suas “ficantes”? Ou seja, como fazer para que os policiais acreditem que todos são iguais perante a lei? De que adianta aulas de Direitos Humanos se quando o policial aborda uma pessoa na blitz, “toda errada”, esta liga para um amigo que não só dar a ordem para liberar o veículo como manda o policial não se meter com quem não é da sua “laia”? 

Soldada Carla Carvalho, desculpe-me pela demora da resposta, mas a verdade é que as pessoas que tem “poder” vão querer os oficiais ao seu lado, desde quando não ousem pisar nos seus tapetes vermelhos. Alguns oficiais não abrem mão de um bom soldado como seu comandado, a fim de poder contar com ele nas situações mais difíceis, mas que ele não se atreva a tomar banho na mesma piscina. E alguns policiais, que não conseguem suportar situações constrangedoras provocadas por superiores, quando chegam nos locais pobres (favelas, invasões, guetos) batem na cara dos moradores para mostrar quem manda e com a certeza que nesses lugares o risco das pessoas terem amigos poderosos é nulo! Desta forma o País dos “tupiniquins” mantem o modelo do “com quem você pensa que está falando?” e aperfeiçoa-se expressões: “cada macaco no seu galho” virou “cada um no seu quadrado”! 

A eficácia das aulas de Direitos Humanos em prol do tratamento igualitário nas ações policiais será pequena enquanto vigorar nos quartéis regulamentos ultrapassados, para dizer o mínimo, que faz com que o policial militar vivencie, constantemente, situações de tratamentos diferenciados – vantajosos para uns, constrangedores para outros! “A palavra convence, mas é o exemplo que arrasta”! Por fim, as leis e os regulamentos militares necessitam serem modificados, URGENTEMENTE, a fim de que sejam respeitada a igualdade das pessoas, sem qualquer tipo de discriminação, conforme preconiza o Estado Democrático de Direito, pois, na atual situação, o sistema incentiva o policial na discriminação de pobres e negros!


2 comentários:

  1. Bom dia Capitão, li este sei artigo e concordo em muitos aspectos, contudo os suas críticas dirigidas ao tratamento militar existentes na Polícia Militar o Sr. vai concordar comigo que nas Forças Armadas é a mesma coisa senão BEM PIOR... Tem Comandantes que fazem festas em suas casas em finais de semana e levam o som do quartel e os pessoal do rancho para confeccionar os alimentos e servirem de garçons e coisas bem piores e infelizmente nós os praças também somos os culpados disso acontecer...

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  2. ...A ninguem e dado o direito de desconhecer seus direitos..a verdade das relaçoes na PM, foram muito bem expostas entretanto, acredito que nos falta mas conhecimento acerca dos nossos direitos e deveres. so nos poderemos mudar esse quadro, e creio que basta retribuir ao superior hierarquico o tratamento que lhe for dado, bem como responsabiliza lo juridicamente por todos os atos de discriminaçao, assedio e perseguiçao.
    E com uma ressalva a continencia deve obrigatoriamente ser retribuida.

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